Lançado originalmente em Dezembro de 1997, “Pancake Corner” é o único registro da Pancake. Em 1999 todas as 6 músicas entrarama coletânea “Where D’You Get Your Information From” lançada em fita cassete pelo midsummer madness.

Anos mais tarde, em 2003, “Pancake Corner” teve seu 3º (re)lançamento numa versão CDr intitulada “Pancake Corner +“. O (+) indicava as 2 faixas bônus, originalmente gravadas em 1999 para a coletânea em CD “Em Órbita”.

Em 2021, depois de uma postagem no grupo 90Under do Facebook surgiu a ideia de relançar pela 4ª vez “Pancake Corner”, desta vez, nos serviços de streaming. Este re-re-re-relançamento virou um exercício de memória misturado com uma boa nostalgia, um “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” do indie rock carioca do final dos anos 90.

Para juntar os pontos, mandamos uma entrevistinha para Marina Macacchero (guitarra, voz), Luiza Naritomi (baixo), Raquel Rodrigues (voz), Márcio Abi-Ramia (bateria) e Pedro Paulo (guitarra). Conheça mais da estória do Pancake e de uma boa parte do underground carioca e brasileiro do final do século passado.

Quando e como começou o Pancake? De onde vocês se conheciam?
Em 1996 com Luiza, Marina e Raquel. A gente se conhecia da escola, éramos da mesma turma no CEN (Centro Educacional de Niterói).

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Pancake no palco: Márcio era o baterista da banda e de quase todas as outras da cidade

A formação sempre foi a mesma?
A primeira formação da banda era Luiza na bateria, Raquel na voz e Marina na guitarra. Ainda não tinha Márcio nem Pedro Paulo. Depois a Luiza foi pro baixo e vimos que precisávamos de um baterista. Não conseguimos encontrar nenhuma menina que tocasse bateria, então resolvemos chamar um menino.

Nossa proposta não era fazer uma banda só de meninas, na verdade éramos amigas que começaram a tocar juntas, então não era um problema ter um menino na banda. Chamamos o Marcio pra bateria, que a gente já conhecia desde 94. Ele tocava em praticamente todas as bandas de Niterói na época. Fizemos alguns shows com essa formação, no DCE da UFF, Empório, no Lugar Comum.

Pedro Paulo (PP) entrou depois tocando guitarra. Ele estudava Arquitetura na UFF e uma vez Marina e Luiza estavam almoçando no Shopping que é perto da escola e da faculdade, viram um menino usando uma camisa do NOFX e foram puxar assunto. Os três começaram a conversar e acabaram ficando amigos. Mais tarde ele acabou integrando a banda como segunda guitarra.

A Raquel precisou sair de licença maternidade quando o Jonas nasceu em 1998 e a Sabrina entrou no vocal, depois a Lívia.

Qual era a idade de vocês quando o Pancake começou? O que cada um fazia naquela época?
Luiza, Marina e Raquel tinham 16 anos e ainda estavam cursando o segundo grau. Márcio tinha 20 anos e era músico. PP tinha 17 anos e estava começando a faculdade.

Quais outras bandas cada um de vocês tocava antes/durante/depois do Pancake
Márcio tocava no Suzy’s Down. Marina chegou até a fazer uma “audição” com eles… Num ensaio tocou “U-Mass” do Pixies mas o povo não se empolgou muito. PP tocava bateria numa banda de ska chamada Core Flakes e no Essential Tension que tinha o som mais próximo do Pancake. Marina tinha tocado baixo em uma banda na escola que foi montada para angariar fundos para a excursão para Ouro Preto, a banda se chamava Black Gold. Márcio também tocou na Black Gold.

Após o Pancake, Luiza teve o Discoteque, Raquel e Márcio faziam parte do Terceiro Segredo e Marina fez o MID.

Não sei porque mas eu sempre lembro do Pancake como uma banda de Niterói. Era isso mesmo? Todos moravam em Niterói? Se não, como era a logística de ensaios?
Sim, todos moravam em Niterói, menos PP que morava no Rio, mas ele estudava na UFF. Acabava que os ensaios eram todos em Niterói então era simples, pois estávamos todos por aqui. Sabrina e Lívia também moravam em Niterói.

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Marina, Luiza e PP em um dos ensaios

A maior parte das músicas é de autoria da Marina, algumas com a Raquel. Como funcionava o processo de criação da banda? Marina levava as músicas pros ensaios e vcs colocavam suas partes?
Sim. Ela nos orientava também. Marina levava as músicas pros ensaios e cada um ia fazendo suas partes, às vezes com orientação da Marina. Ela fazia num violão que nem tinha todas as cordas. Ou às vezes dormia na casa da Luiza e fazia as músicas em um violão que tinha lá.

As letras tbm eram da Marina? Ou a Raquel escrevia?
A Raquel escreveu duas letras:”Motherhood” e “Sundays”. O resto foi a Marina.

De acordo com memória da Raquel, Marina musicou “Motherhood” a partir da letra e Raquel fez a letra para “Sundays” a partir do que Marina cantarolava como melodia. Se formos analisar hoje, as letras (em inglês) tinham um vocabulário e estrutura muito bons para adolescentes brasileiras, contando com o que Marina chamava de “licença poética” para encaixar na melodia. Hoje a Raquel, como professora da língua, acha graça de alguns trechos. Ainda assim, houve até um quadrinista que se inspirou em “Sudden Swallow” para criar uma historinha que ficou muito legal.

De quem é a HQ?
Do Roberto Hollanda, ele tinha um zine que agora não tô conseguindo lembrar o nome. Acho que ele é quadrinista hoje em dia. A gente se correspondia, e ele mandou uma carta perguntando se podia fazer a versão em quadrinhos da música. Eu achei muito maneiro, é uma honra quando uma coisa que você faz toca outra pessoa a ponto dela querer se expressar.

A “Pancake’s Corner” saiu em 1997. Vocês lembram quando / onde / como foi gravada?
Um amigo da família da Luiza, Sérvio Túlio (do Saara Saara), tinha nos dado algumas horas em um estúdio de um amigo dele em Gragoatá, um bairro de Niterói. O único que tinha alguma experiência com gravação era o Márcio. Nós fomos gravar mas o estúdio não tinha bateria. Na verdade era um quartinho com isolamento acústico e os equipamentos, os microfones, amplificadores e uma mesa Tascam de 8 canais foi o que usamos para gravar. Mas não tinha bateria.

Então, chegando lá resolvemos aproveitar o horário marcado e gravamos guitarra, voz e baixo de duas músicas na primeira sessão (“Tried to Say Before” e “Outside”). Só depois descobrimos que a bateria tinha que ser gravada antes, então fomos para um estúdio na Tijuca, o Cheese Factory. Márcio penou pra encaixar a bateria nas duas músicas já gravadas mas conseguiu. Os barulhinhos de baqueta que se ouve no fim de “Outside” são justamente um momento de desabafo de Márcio: quando finalmente conseguir sincronizar as gravações, ele jogou as baquetas no chão.

Com as partes de baterias gravadas, voltamos pro estúdio de Niterói e gravamos as outras músicas.

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Inicialmente vocês lançaram “Pancake Corner” sozinhas, certo? Lembram como o mm entrou na estória? Se não me falha memória, eu vi um show em Niterói, acho que em Pendotiba… procede? As músicas entraram numa fita coletânea chamada “Where D’You Get Your Information From”. O que vocês acharam da coletânea?
Sim, lançamento completamente independente. Luiza e Marina faziam tudo, desde replicar as fitas passando de um toca-fitas pro outro, recortar as xerox pra fazer a capinha e o encarte com as letras, até a distribuição. A distribuição era feita por correio, enviávamos as fitas para os zines resenharem e com isso as pessoas entravam em contato e vendíamos também pelo correio. E nos shows a gente costumava levar as fitas e pedir para colocar nas banquinhas de selos e outras bandas.

Sobre a coletânea, ninguém lembra muito bem. Mas a gente acha que o contato com o midsummer madness foi no festival Motim – Mulheres em Ação no Espaço Cantareira. Luiza lembra de termos sidos chamadas pra fazer parte, mas parece que acabou demorando o lançamento. Também lembra de ter ficado feliz de recebermos reconhecimento e termos sido selecionadas.

Fizeram muitos shows em 1997, 1998? Aonde tocavam? Algum show memorável? Alguma roubada inesquecível?
Fizemos muitos shows.  Tinha o Estúdio Bar, que era um bar com um galpão e palco atrás. A pedido da Marina, o dono deixou a gente produzir um show com o Dirty Shoes. A casa lotou e o dono abriu pra gente que o espaço ao lado, antigo República da Banana, era do pai dele. A partir dali reinauguramos o local passando a chamar Estúdio Bar que se tornou uma referência no underground Niteroiense da época.

Em 1999 teve show quase todo fim de semana. Nessa época do Estúdio Bar tocamos com Mukeka di Rato, Pin Ups, Zumbi do Mato, Againe, Curinga, Sorry Figure, Blind Pigs. E quando faltava alguma banda em alguma data, a gente se auto-escalava para tocar!

De memoráveis podemos citar o show do DCE da UFF, nosso primeiro show. Foi com o Interzona Inc, e foi legal pois além de ter sido nosso primeiro show, todos os nossos amigos estavam lá, foi bem empolgante.

O (Festival) Motim na Cantareira, em Niterói, foi bem legal, tocar em um evento que na época teve bastante divulgação. O show no Empório em Ipanema foi importante pra gente pois várias bandas que a gente gostava tocavam lá e era pro público do Rio. O show que fizemos em Macaé em um lugar chamado Chaplins foi nosso primeiro show fora do circuito Rio – Niterói. Fomos convidadas pelos meninos do My Sister Anne, André e Agnaldo. Foi muito divertido. E nosso show em São Paulo, no Alternative, que foi nosso último show.

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Em 1998 vocês deram uma parada e voltaram um tempo depois, não foi? Qual foi o motivo da parada mesmo?
Na verdade não paramos em 1998, Raquel que parou pois teve o seu filho, o Jonas. A banda parou em 2000 e não voltou mais a não ser por apresentações comemorativas. Tocamos depois no Odisséia e no Convés em 2003, mas não chegou a ser um retorno. Nestes shows a Luiza não tocou pois já estava morando fora, quem tocou foi o Lucas.

Em que ano a Livia entrou? A Raquel não voltou mais? Posso estar enganado, mas numa foto de vocês tocando no Algumas Pessoas Tentam te Fuder, no Odisséia, (provavelmente 2003) eu tenho quase certeza que é a Raquel.
Raquel –  Sou eu mesma lá no revival mas nunca mais voltei desde que sai pra parir o Jonas em Julho 98. Eu tenho pavor de palco e bebia para superar o pânico de cantar para um público.

Só topei alguns revivals, mas passava mal de vomitar (sem ter bebido nada) antes de subir no palco.

Vocês mencionam o show do Alternative em SP como último show. Quando foi? Foi mesmo o último?
Foi em novembro de 1999, com o pessoal do Spots, uma banda de Araras que a gente chegou a tocar junto no Estúdio Bar, em Niterói.

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Vocês tocavam com bandas mais hardcore que o Pancake. Como era a reação do público? Vocês preferiam tocar nestes eventos? Na verdade acho que eram as opções que exisitiam, né?
Raquel – Eu me lembro de ficar de cara com umas meninas fazendo passos de balé num show nosso na half pipe de skate de São Francisco. Mas o público costumava nos receber muito bem, geralmente. Tinha uma galera que cantava junto.

Luiza – Tinhamos muitos amigos nessas bandas e eram bandas muito ativas na época. Eu pessoalmente gostava sim, acho que na época no Rio tinha muito overlap, a mesma galera também ia às festas na Maldita, no Bukowski, no Volúpia, shows no Garage, eventos na Fundição (Progresso)…

Marina – Como a Luiza disse, tínhamos muitos amigos que tocavam em bandas de HC, acho que tínhamos até mais amizades HC do que indie. Era um pessoal muito ativo na cena, então eu até enxergo como um movimento natural tocar mais com essas bandas. Agora, em relação ao público, eu não lembro de nenhum grande incidente. Acho que na época, e até hoje entendo assim, tudo se tratava de música. Eu ouvia de tudo, então a música que eu fazia tinha influência de tudo que eu ouvia. Pra que se limitar a um estilo? Deixo a cargo de quem for ouvir, classificar da forma que achar melhor :-)

As duas músicas extras “Nova” e “Love Canal” foram gravadas para a coletânea “Em Órbita”. Vocês lembram aonde/como/quando foram gravadas?
Essas duas músicas foram gravadas no estúdio Freezer (da Pelvs) que ficava em uma galeria na Praia de Botafogo. Um dos requisitos para entrar na coletânea era que as músicas tinham que ser inéditas então fomos pro estúdio gravar. Quem canta nessas duas músicas é a Lívia.

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Pancake, com Raquel nos vocais, no festival Algumas Pessoas… de 2003 no Teatro Odisséia, na Lapa (RJ)

Pelos meus registros, em 2003 o midsummer madness relançou a “Pancake Corner” com as 2 faixas extras. Vcs lembram mais ou menos disso?
Sim, lembramos, e a gente lembra do show no Odisséia naquele festival do MM (Algumas Pessoas Tentam te Fuder). Teve um incidente, alguém foi embora com a guitarra da Marina, mas depois ela conseguiu recuperar. E Raquel tinha uma prova de concurso no dia seguinte mas não conseguiu fazer. Um aluno adulto da Raquel viu a banda na TV nesse evento.

Quando foi que rolou o problema com a Pancake metal? Num release que eu escrevi, cito cartas de advogados da banda falando para vocês não usarem mais o nome… teve isso?
Foi em 2000 mais ou menos. Chegou uma carta na casa da Luiza falando que nós não podíamos usar o nome Pancake pois pertencia a outra banda. Quando fomos entender o que estava acontecendo, vimos que uma outra banda, mais recente, havia registrado o nome e mandou a tal carta mandando a gente parar de usar. Nós entramos com um processo, o Bruno do Barneys nos ajudou com tudo isso, era nosso advogado. Alegamos que como usávamos o nome a mais tempo, e nome de banda, nome artístico não é um produto registrável, e sim uma extensão do artista, o nome nos pertencia independente do registro.

Nós perdemos na primeira, segunda e terceira instância, parece que nossa tese não teve muito sucesso. Fun fact: quem pegou nosso processo na terceira instância foi a Ministra Carmen Lúcia.

No fim acabou que a tal Panfake, que era uma banda de produtor, deixou de existir e conseguimos registrar o nome de vez.

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Quando a banda acabou? Teve um motivo?

A banda acabou em 2000. Aconteceu o que o pessoal chama hoje em dia de ghosting. Teve um show sem o Márcio porque ele não poderia viajar, Marina e PP (que eram namorados) terminaram e Luiza foi morar em NY. Aí foi acabando, mas não teve um momento que viramos e falamos: a banda acabou. Nós não chegamos a brigar nem nada.

Qual a impressão que vocês têm das músicas hoje?
A gente acha que as músicas estão bem atuais. Acreditamos que se uma pessoa parar pra ouvir hoje em dia, vai curtir bastante. Temos bastante orgulho delas.

Quem continua com banda hoje?
Raquel – Eu tentei ressuscitar o Terceiro Segredo com Hudson Barros e Paulo Pontes (só pra ensaio e, talvez, gravação), mas aí veio a pandemia.

Luiza– Não tenho mais banda mas o Bil colocou o Discoteque no streaming esses dias.

Marina – eu cheguei a tocar com o mid depois do Pancake, a gente gravou uma demo e fizemos uns shows na Lapa, em Mesquita, no Convés em Niterói. Mas paramos lá pro início dos anos 2000. Temos 2 clipes no Youtube: Gone e Neurosis.

Ouça Pancake Corner na página da banda.
Ouça, baixe ou compre Pancake Corner + no nosso Bandcamp.
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